Dona de um dos slogans mais lembrados: “Dedicação total a você”, a Casas Bahia, uma das maiores redes varejistas do Brasil, está enfrentando uma grave crise financeira. Parte do grupo Via (anteriormente via Varejo), ela teve um prejuízo de R$ 492 milhões no segundo trimestre de 2023 e uma dívida de R$ 5,479 bilhões. Essa crise foi agravada pela inflação, pelos juros altos e pela queda do consumo. Para tentar se recuperar, a Via anunciou um plano que inclui o fechamento de até 100 lojas, o corte de 6 mil funcionários e a redução de R$ 1 bilhão em estoques neste ano. É esperado que a empresa possa gerar R$ 1 bilhão em lucro líquido antes do imposto de renda, mas não há uma previsão de quando isso acontecerá.
No viés da macroeconomia, a situação atual da Casas Bahia é preocupante. A empresa anunciou que vai demitir cerca de 20% dos seus funcionários, o que representa mais de 7 mil pessoas desempregadas. Essa medida visa reduzir os custos e aumentar a competitividade, mas pode ter efeitos negativos no consumo, na renda e na arrecadação de impostos. O corte de funcionários poderá afetar a economia sob dois grandes aspectos: redução da demanda e redução da oferta de produtos. Pela redução da demanda, implica numa diminuição do poder de compra dos trabalhadores demitidos, que passam a consumir menos bens e serviços. Isso afeta não só a própria Casas Bahia, que vende produtos de consumo durável, mas também outros setores da economia, como alimentação, vestuário, transporte, lazer, etc. O segundo ponto é a demissão de funcionários que reduz a arrecadação de impostos sobre a renda e sobre o consumo, diminuindo a capacidade do governo de investir em áreas como saúde, educação, infraestrutura e segurança. Pela redução da oferta, o corte de funcionários pode comprometer a qualidade e a eficiência dos serviços prestados aos seus clientes. Com menos trabalhadores, terá dificuldades para atender à demanda, manter os estoques, entregar os produtos, prestar assistência técnica e etc. Isso pode gerar insatisfação e perda de fidelidade dos consumidores, que podem optar por outras empresas do setor. Além disso, essa demissão em massa afeta a produtividade e a inovação da empresa, que perde capital humano qualificado e experiente.
Mas como a empresa chegou nessa situação? A resposta envolve uma série de fatores, como a inflação, os juros altos, a queda do consumo, a concorrência acirrada e a gestão da dívida. A inflação reduziu o poder de compra das famílias, enquanto os juros altos encareceram o crédito e aumentaram o custo da dívida da empresa. A queda do consumo afetou as vendas do varejo, que estão praticamente estagnadas desde 2020. A concorrência acirrada também pressionou as margens da empresa, que teve que enfrentar rivais como Magazine Luiza, Americanas e Mercado Livre. A gestão da dívida foi outro ponto crítico para a empresa, que fez empréstimos com juros baixos na pandemia, mas viu a taxa Selic subir de forma expressiva em 2021 e 2022. A expectativa, com as medidas anunciadas, é que a empresa possa gerar R$ 1 bilhão em lucro líquido antes de imposto de renda, mas não há uma previsão de quando isso acontecerá. No entanto, esses esforços ainda não foram suficientes para reverter o cenário desfavorável que a empresa enfrenta atualmente.
Analiso que a tendência é que a empresa siga os mesmos caminhos das outras grandes varejistas, que sentiram bastante a retração nas margens e queda no volume de vendas. Com o fechamento das unidades anunciadas, poderá ter um bom ganho de eficiência, porém não será suficiente para garantir a sua capacidade de pagamento e diminuir o tamanho da sua dívida de forma consistente. Precisará, inevitavelmente, iniciar um processo de recuperação extrajudicial e renegociar a sua dívida com bancos e fornecedores.
Com essa crise, todos perdem! Porém, entre os mais prejudicados estão os funcionários, os fornecedores, os clientes e os acionistas da empresa. Os funcionários poderão sofrer com possíveis atrasos nos salários, demissões e falta de perspectivas para crescimento. Os fornecedores poderão enfrentar dificuldades para receber os pagamentos pelos produtos vendidos à Casas Bahia, o que poderá comprometer seu fluxo de caixa e sua capacidade de pagamento e investimento. Os clientes ficam insatisfeitos com a queda na qualidade do atendimento, dos serviços e das mercadorias oferecidas pela rede. E os acionistas vêem o valor de suas ações despencar no mercado, além de terem que lidar com processos judiciais e investigações sobre possíveis irregularidades na gestão da empresa.
Wagner Moraes, CEO da A&S Partners.