Qualquer número ou informação sobre a guerra deflagrada no sábado (7) por Israel contra o Hamas — em reação ao sanguinário ataque do grupo islâmico — estaria agora desatualizado. São centenas de civis e combatentes mortos, de ambos os lados. Tem sido quase impossível fechar um balanço do número de vítimas daquele que é considerado um dos maiores desafios para a sociedade judaica desde o Holocausto, na Segunda Guerra. E se o impacto do número de vítimas ainda é incerto, o que já pode ser mapeado é seu efeito na economia global.
Especialistas ouvidos pela DINHEIRO afirmam que as incertezas internacionais geradas pela guerra, somadas às preocupações já instaladas em torno dos juros, do não crescimento das maiores economias e ao prolongamento de outra guerra, a da Ucrânia, tensionam as perperpectivas de recuperação e o humor dos mercados.
O cientista político e professor de Relações Internacionais da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) Maurício Fronzaglia avalia que o conflito em Israel terá efeitos sobre a economia brasileira, em especial:
• pela volatilidade na bolsa,
• aumento do preço do petróleo,
•e pressão sobre a inflação.
“Com mais instabilidade internacional, o governo precisa fortalecer ainda mais a agenda e demonstrar responsabilidade fiscal”, disse. E cuidar de casa parece a única coisa que o governo Lula pode fazer por enquanto. “Como o Brasil não é grande player no cenário da diplomacia internacional, há pouco o que fazer para evitar outros tipos de impacto.”
No termômetro de efeitos, o problema econômico imediato é o petróleo, segundo avaliação do economista Beto Saadia, diretor de investimentos da corretora Nomos. Para ele, em alguma escala, os preços internacionais dos combustíveis deverão ser afetados.
Mesmo que Israel não seja um produtor, o confronto com o Hamas pode atrair para a guerra países como Irã e Arábia Saudita, dois protagonistas da indústria mundial de energia.
Para ele, a depender do andamento do conflito, essa pressão nos preços do petróleo pode afetar até o andamento da Selic nos próximos encontros do Banco Central, ainda que, por enquanto, a autoridade monetária tenha sinalizado que há condições internas suficientes para não mudar a trajetória.
E se o Brasil tenta tratar o assunto como um fato mais lateralizado do ponto de vista econômico, o Fundo Monetário Internacional (FMI) se mostra mais preocupado.
Segundo o economista-chefe da instituição, Pierre-Olivier Gourinchas, a recuperação da economia global será, sim, prejudicada por um possível aumento dos preços do petróleo causado pela guerra entre Israel e o Hamas.
Pelas contas do FMI, um aumento de 10% nos preços do petróleo reduziria o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) mundial em 0,15% e aumentaria a inflação global em 0,40%. Desde o dia 7, quando começou a guerra, o barril subiu 4%. “
Isso aconteceu em crises e conflitos anteriores. Só de haver potencial risco de perturbação na produção no ou no transporte de petróleo na região, os preços sobem”, disse Gourinchas. “Temos de ser cautelosos, por enquanto. É muito cedo para realmente avaliar qual poderá ser o impacto do conflito”, disse.
No relatório no FMI, a economia global crescerá 3% em 2023, um corte em relação à estimativa anterior, de 3,5%. Em 2024, o crescimento do PIB mundial não deve ultrapassar 2,9%, com uma inflação de 4,8%. Os dados, no entanto, não consideram a escalada no conflito.
Essa projeção foi feita antes de o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, sinalizar apoio a Israel. Ele deve encaminhar ao Parlamento um projeto para liberar recursos a serem usados no suporte do país atingido pelos palestinos. “Faremos tudo para que Israel possa se defender e espero que o Congresso vote a ação urgentemente para ajudar a financiar nosso parceiro fundamental.”
Fora as questões cambiais, inflacionárias e diplomáticas, outro fator de atenção é o risco de desestabilização da cadeia global de suprimentos, de acordo com o economista Wagner Moraes, especialista em macroeconomia, mercado financeiro e CEO da A&S Partners.
Para ele, haverá consequências diretas e indiretas para a economia mundial e, consequentemente, para o Brasil. “Qualquer tensão elevada na região aumenta o risco de interrupções no Canal de Suez, um dos corredores de comércio mais importantes do mundo”, afirmou. “Uma obstrução ou fechamento temporário do canal pode levar a atrasos no transporte global de mercadorias.” Para o Brasil, isso pode significar atrasos nas exportações e importações, com consequente impacto nos preços e na balança comercial.
A indústria global de tecnologia também será afetada, na avaliação de Moraes. Como Israel é um hub tecnológico global, especialmente em setores como cibersegurança, tecnologia da informação e saúde, a instabilidade prolongada pode resultar em queda do fluxo global de investimentos estrangeiros.
Além disso, o turismo, vital para a economia israelense, pode ser gravemente afetado. “Essa queda no fluxo de turistas e investimentos pode ter repercussões na economia global, afetando parceiros comerciais e investidores.”
Enquanto o clima esquenta lá fora, o Brasil parece esperar. Até agora, o Brasil não apresentou uma posição clara no âmbito político do conflito – embora tenha condenado o ataque do Hamas. Para José Cláudio Securato, doutor em economia e presidente da Saint Paul Escola de Negócios, será fundamental o governo definir uma posição firme para que possíveis desdobramentos econômicos não contaminem os negócios do País no campo internacional.